terça-feira, 11 de junho de 2013

Psicanálise sideral



Um sono pesado do lado estranho da montanha
De pé no estrado por cima do rio
Na mão o machado sobre a lenha
O fio da lâmina metalizando o frio

O peso do castelo no ângulo azul do horizonte
A massa de argila lodosa ao pé do barro
A água suspensa do escorregar da fonte
O caminho estreito do burro atrás do carro

A taça que cintila no estalar da luz no arvoredo
O delírio do ídolo das fadas no terraço:
Varandas penduradas sobre os mundos imensos do segredo:
Terror nocturno da solidão do espaço


10/6/2013

Fernando Henrique de Passos

quinta-feira, 6 de junho de 2013

Uma psico-biografia de Santa Teresa do Menino Jesus

Edições Carmelo acabam de publicar uma obra
 sobre Santa Teresa do Menino Jesus


«Se a paz habitar o nosso espírito, abre-se a porta para o caminho da perfeição. Porque onde habita o Amor, aí vive a paz.»

«E a paz surge em quem sabe "dar" o Amor, da mesma maneira que o sabe "receber".»

«A paz que começa no nosso coração transmite-se aos outros corações. A paz é o fim último do "viver de Amor"»

        Teresa Ferrer Passos «Poética do Sofrimento e do Amor em Santa Teresa de Lisieux» in revista Faces de Eva, nº16, 2006, p.59.

sábado, 1 de junho de 2013

No Dia Mundial da Criança - Pequena Homenagem

Nuvem Pequenina de Céu

      No átrio de uma escola, onde não se lembrava de alguma vez ter entrado, Beatriz viu um letreiro que dizia: «Nuvem pequenina de céu». Ficou pasmada. Nem queria acreditar. Como podia estar a ver ali um recreio de uma escola?! Correra tão depressa e chegara, sem dar por nada, àquele lugar?! Só tinha a certeza de não querer encontrar qualquer outra escola.

      Afinal, ali havia também uma escola?! Como, estando tão distante da sua escola, entrara numa escola que lhe parecia a mesma? Ela, que fugira de uma escola por não gostar de lá estar, que penetrara num mundo livre de maldade e logo entrava, de novo, numa escola? «Só pode ser igual à outra!», gritou desesperada. As escolas não eram todas iguais? Se todas eram escolas, todas deviam ser iguais, pensava com uma grande desilusão a percorrer todo o seu corpo encharcado pela água gelada do rio, mas cheio de uma nova esperança.

      A sua cabecinha, estonteada por uma fuga tão vertiginosamente rápida, sentia-se demasiado confusa e estranha. Ali, naquela escola via tantos meninos e meninas correndo, jogando, rindo. Mas como fora ali parar?! Quem a empurrara para aquele lugar que só lhe trazia terríveis lembranças de um tempo horrível e tão próximo? Precisamente, o lugar que ela tanto desejara esquecer para sempre, aparecia-lhe, inesperadamente, no fim do mundo?!

      De súbito, Beatriz pensou que talvez se tivesse enganado na direcção que tomara. Tal a sua precipitação na fuga, tal o desejo de não voltar à escola… Devia ter seguido por um caminho errado… Mas, como se enganara?! Haveria mais do que um caminho? E ela que julgava só haver um destino por aquele rumo…

      Restava-lhe fugir de novo, sair dali. Mas como fazê-lo? Não via uma porta, nem um portão, não via uma rua, nem uma estrada. Estava dentro de um recinto aberto e, na verdade, completamente fechado. Naquele lugar, onde todos pareciam brincar divertidamente, também não descobria uma janela, sequer uma estreita fresta. Onde chegara, afinal?! O ambiente tão natural numa escola parecia-lhe idêntico ao da escola tenebrosa donde fugira. Encontrava-se numa escola, era iniludível. Ora, isto só poderia ser o começo de um novo suplício…

      Agora que escolhera a liberdade de ser outra criança, a liberdade de ter o seu próprio destino, acabava de entrar ainda, outra vez, numa escola?! Quanto tempo desejara ver-se livre daquele recreio onde os meninos da sua turma lhe batiam todos os dias, como se ela estivesse ali a mais, estivesse ali sem dever, como se ela fosse um empecilho, um estorvo ou um bocadinho de lixo abominável. E, depois da fuga salvadora, caíra numa armadilha… Tinha a certeza. Entrara de novo numa escola!

     Sem ela ter tido tempo de procurar uma eventual saída, duas meninas e um menino saíram do grupo em que brincavam e, olhando-a, disseram em uníssono: «Anda Beatriz, vem brincar connosco». Estupefacta ante o simpático convite, respondeu toda a tremer: «Brincar com vocês? Vocês não são como os outros?!». «Vem, não tenhas medo. Somos teus amigos». «Meus amigos, como?», interrogou Beatriz, sem acreditar na sinceridade das suas palavras.

     «Aqui, numa pequenina nuvem de céu, todos são amigos e, por isso, ninguém fica de fora da amizade», disseram a sorrir. «Mas eu devo ficar como sempre fiquei! Sempre fui vista na escola como um verme, um verme repelente…», insistiu Beatriz, sem acreditar no que lhe diziam. Seria um embuste para a apanharem? Iria cair numa nova armadilha? Ou, pelo contrário, estavam a dizer-lhe a verdade?! Mas como podia Beatriz acreditar?!

     Ao verem-na sem responder e com as faces incendiadas de medo, já nem conseguiam sorrir. Como a tinham magoado, afinal! Depois, viram-na a esconder-se por traz de um fiozinho de água de uma das fontes daquela escola, cheia de fios de água, plantas com frutos e relvados largos com pequenos esquilos, coalas e lémures a saltitar. Todos os animais que saiam das suas tocas tinham um pelo aveludado, olhos dóceis e patinhas felpudas.

     Entretanto, Beatriz começou a divertir-se com aqueles bichinhos inesperados. E, os três meninos saídos do grupo, não resistiram a chamá-la de novo: «Tu abandonaste o tempo da inimizade, rejeitaste o tempo da cólera, tu tiveste a coragem de escolher o tempo da harmonia e o tempo da paz. Aqui, encontras esse tempo em que nunca chegaste a viver. Nesta escola serás tratado por irmã». «Escolhi o único tempo em que eu podia viver, o tempo da amizade», respondeu Beatriz, já confiante e com um sorriso nos lábios.

     Naqueles momentos, a pequena Beatriz começou a sentir que podia haver escolas com meninos bem diferentes daqueles que estavam na escola donde fugira. Afinal, havia escolas com meninos amigos uns dos outros, sem marginalizados, sem os «fora do grupo», sem martirizados, só porque eram cheios de mansidão. Naquela escola, que estava numa pequenina nuvem do céu, não havia que ter medo de ficar lá, sempre a aprender novas coisas.

     Agora, Beatriz não pensava mais em fugir. Naquela escola, a amizade apagava a mais pequena sombra de violência. Ali, não havia meninos a provocarem sofrimento aos que tinham só afecto no coração. Neste lugar, em que tudo era movido pelo sentimento da fraternidade, Beatriz queria ficar, sem relutância, sem qualquer susto. Aqui, até poderia ter encontrado um lugar para sempre, mesmo sendo, e ainda sendo, um lugar chamado escola.*

Teresa Ferrer Passos

*Conto inédito

terça-feira, 28 de maio de 2013

Um poema de Mia Couto



Identidade

Preciso ser um outro
para ser eu mesmo

Sou grão de rocha
Sou o vento que a desgasta

Sou pólen sem insecto

Sou areia sustentando
o sexo das árvores

Existo onde me desconheço
aguardando pelo meu passado
ansiando a esperança do futuro

No mundo que combato morro
no mundo por que luto nasço

Mia Couto*, Raiz de Orvalho e Outros Poemas
(1ª edição em Moçambique em 1983).


*Mia Couto (nome literário) nasceu, em 1955, em Moçambique. Filho de pais portugueses, acaba de ser galardoado com o Prémio Literário Camões, o mais importante da criação literária da língua portuguesa. A sua obra romanesca foi “muito valorizada pela criação e inovação verbal, mas tem tido uma cada vez maior solidez na estrutura narrativa e capacidade de transportar para a escrita a oralidade”.



quinta-feira, 23 de maio de 2013

Os Espelhos do Amor





“A vida me ensinou que as pessoas são amigáveis​​, se eu sou

amável, que as pessoas são tristes, se estou triste,

que todos me querem, se eu os quero,

que todos são ruins, se eu os odeio,

que há rostos sorridentes, se eu lhes sorrio,

que há faces amargas, se eu sou amargo,

que o mundo está feliz, se eu estou feliz,

que as pessoas ficam com raiva quando eu estou com raiva,


que as pessoas são gratas, se eu sou grato.

A vida é como um espelho: se você sorri para o espelho,

ele sorri de volta. A atitude que eu tome perante a vida é a

mesma que a vida vai tomar perante mim.”

                                Mahatma Gandhi (1869-1948)
*

* Esta reflexão foi extraída do Blogue «Carvão em Fundo Branco»

quarta-feira, 22 de maio de 2013

As Misericórdias, a Lei e o Voluntariado

Rainha D. Leonor
(Fundadora das Misericórdias em 1498)

A Lei de Bases da Economia Social aprovada, por unanimidade, na Assembleia da República, em 15 de Março de 2013, "estabelece as bases gerais do regime jurídico da economia social", "confere às Misericórdias o destaque que merecem no sector, autonomizando-as no elenco das entidades que integram a economia social". 
Jorge Gaspar 

"Num período de profunda crise, com uma economia anémica e com fortes sinais de depressão, o setor social tem de ser capaz de se renovar, de alterar hábitos de trabalho e de gestão".
Paulo Moreira 

"O voluntariado não pode ser visto como uma moda, pois a moda passa e a missão tem de continuar".
Joaquim Caetano (Coordenador do Voluntariado do Montepio)

"A grande maioria dos currículos dos jovens de outros países europeus apresenta o voluntariado como experiência."
Rui Pontes (Voluntário do Montepio)

in jornal Voz das Misericórdias, Abril 2013

domingo, 19 de maio de 2013

A Propósito da Descida do Espírito Santo sobre os Apóstolos



“O Espírito Santo faz-nos entrar no mistério do Deus vivo e salva-nos do perigo de uma Igreja gnóstica e de uma Igreja narcisista, fechada no seu recinto; impele-nos a abrir as portas e sair para anunciar e testemunhar a vida boa do Evangelho, para comunicar a alegria da fé, do encontro com Cristo. O Espírito Santo é a alma da missão”.

Homilia no Dia Comemorativo de Pentecostes 
Roma, 19 de Maio de 2013 

Papa Francisco

Subitamente surge. Tem o teu rosto


O paraíso terrestre é uma flor verde.
As árvores abrem-se ao meio.
O que é sucessivo perde-se.
Se o tempo modifica os seres e os objectos
eu sinto a diferença e gasto-me.
O sol é um erro de gramática, a luz da madrugada
uma folha branca à transparência da lâmpada.
Soam então os barulhos. Soam
de dentro das janelas,
de dentro das caixas fechadas há mais tempo,
de dentro das chávenas meias de café.
É tarde e és tu,
acima de tudo,
entre a manhã e as árvores,
à luz dos olhos,
à luz só do límpido olhar.

In Obra Poética (1972-1985)

                                               Nuno Júdice*

* Nuno Júdice foi galardoado no dia 16 de Maio de 2013 com o XXII Prémio Rainha Sofia de Poesia Ibero-Americana, atribuído pelo Património Nacional espanhol e pela Universidade de Salamanca. Em 2003 o mesmo prémio foi atribuído a Sophia de Mello Breyner Andresen.

sexta-feira, 17 de maio de 2013

Lei para adopção de crianças por casais homossexuais?

Rita Lobo Xavier, especialista em Direito da família:
O projecto de lei aprovado esta sexta-feira no Parlamento que prevê a co-adopção por casais do mesmo sexo desvirtua a finalidade da adopção, que seria a de criar um vínculo semelhante à filiação natural”.(…) “É de uma grande violência para o instituto da adopção" ligar "uma criança à fragilidade do vínculo" entre duas pessoas "que nunca poderiam ser os progenitores naturais daquela criança".

Manuel Braga da Cruz, ex-reitor da Universidade católica:
O que hoje se passou é um passo mais na degradação moral de Portugal”.
“Lamento que o Parlamento português tenha tomado uma decisão que considero gravosa para a sociedade portuguesa. Nós estamos a assistir há um tempo a esta parte a um plano inclinado, decisão após decisão”.

Federação Portuguesa pela Vida:
O princípio da vida está necessariamente ligado à união entre um homem e uma mulher, e todos os diplomas que tenham o efeito de deturpar este dado da natureza são perniciosos e ofendem a dignidade da pessoa humana".

Padre Manuel Morujão, porta-voz da Conferência Episcopal Portuguesa:
Independentemente do resultado das votações que hoje tiveram lugar na Assembleia da República, a Igreja reafirma, por motivos simplesmente antropológicos, que a adoção de uma criança não é um direito de qualquer pessoa adulta, solteira ou casada, heterossexual ou homossexual”.


17 de Maio de 2013 (Excertos da Comunicação Social)

Lei para adopção de crianças por casais homossexuais? *




«A vida transforma os segredos possuídos
pela sociedade em perigo como um voto de
 advertência. A realidade do mundo obstina-se
em fugir à compreensão do corpo amado»

Nuno Júdice, Obra Poética (1972-1985)


     Toda a criança tem geneticamente um pai e uma mãe. Como se pode defender que a criança seja adoptada por dois homens – dois pais –, ou por duas mulheres –  duas mães –, desde os seus primeiros anos de vida?

     Se nesta faixa etária não se pode pergunta à criança se concorda ou não com aquela adopção, nem tão pouco explicar porque vai ser inserida numa família só com dois pais, ou só com duas mães, o que se está a fazer?

     Em primeiro lugar, oferece-se uma mentira à criança, uma mentira sobre a sua origem genética, sobre a sua origem existencial. Na verdade, a criança não merece que lhe “mintam” (no sentido de omitir a verdade) sobre as suas raízes de vida, sobre os autores do seu nascimento, tão estruturantes da personalidade.

     A verdade é que toda a criança teve um pai e teve uma mãe. Não pode nascer de outro modo. Perdoará ela, um dia, a falsidade, o desrespeito pela sua verdade originária, o ponto mais alto da sua dignidade humana? E, além disso, não soçobrará a sua vida bamboleante numa personalidade desestruturada, com os emergentes conflitos quase insuperáveis no seu carácter?

     A criança é um ser frágil que necessita de ser muito amado, mas não se deve fazê-la alcançar essa finalidade, sem ter em conta a sua própria palavra. Não é legítimo usar a criança indefesa para satisfazer interesses imediatos de uma sociedade à beira de se auto-aniquilar, qual Sísifo, na busca sem travão da felicidade. 

17 de Maio de 2013

                                                                                                    
Teresa Ferrer Passos


* O  projecto de lei n.º 278/XII do PS foi aprovado na generalidade com 99 votos a favor e 94 contra, além de nove abstenções.

terça-feira, 14 de maio de 2013

A Economia Social conquista força de lei


«A criação da Lei de Bases da Economia Social vem finalmente reconhecer o mérito e o trabalho deste setor e a sua aprovação, por unanimidade, na Assembleia da República é o melhor testemunho desse reconhecimento.»

«Pela primeira vez em Portugal é reconhecido com força de lei a  especificidade e autonomia das Misericórdias.»


«Destacamos o primado da pessoa e o respeito e promoção dos valores da solidariedade, da igualdade, da não discriminação, da coesão social, da justiça e da equidade, da transparência e da subsidiariedade.»

Mariano Cabaço, Voz das Misericórdias, Abril de 2013

domingo, 12 de maio de 2013

Ascensão de Jesus ao Céu


Após uma refeição improvisada com os apóstolos, estes perguntaram entusiasmados:
“Senhor, é agora que vais restaurar o reino de Israel?”.
(Act 1, 6)




Não confirmando a interrogação, como eles julgavam, Jesus respondeu que “uma força do Espírito Santo desceria sobre eles e seriam Suas testemunhas em Jerusalém, por toda a Judeia e Samaria, e até aos confins do mundo”. 
(Act 1, 8)




«Dito isto, elevou-Se à vista deles e uma nuvem subtraiu-O a seus olhos»
(Act 1, 9)


«E eles, depois de O terem adorado, voltaram para Jerusalém com grande alegria»
(Lc 24, 52)


sexta-feira, 10 de maio de 2013

Cartografia



Não esqueças o mapa das estradas,
O carreiro na orla dos carreiros,
As latitudes perturbadas,
Os labirintos estrangeiros.

Não esqueças o carro abandonado,
A inscrição no muro do convento,
O príncipe exilado,
Os murmúrios trazidos pelo vento.

E se te levam ao tesouro as várias pistas
Mas no cofre não há mais que um pergaminho,
Não desistas:
É outro mapa – retoma o teu caminho.

9/5/2013

Fernando Henrique de Passos

domingo, 5 de maio de 2013

A Nossa Senhora do Perpétuo Socorro



Mãe querida, desde a minha juventude
A tua doce Imagem encantou-me o coração
No teu olhar eu lia a ternura
E junto de ti achava a felicidade

                 Santa Teresa do Menino Jesus




As maias


(invoco, para a Lira, o Arcano e Arcaico do Sápido Sol)

às Mães e às mulheres do meu País

Tu nas águas apareces
E apareces nas ervas,
Nos raminhos e nas preces,
Nos veados e nas cervas.

És o verde, em toda a terra,
És a Madre, em todo o ló.
A Madrinha, pela serra,
E a Senhora do Ó.

Tu soergues o somenos
Numa barca de baunilha;
Eis que vem a flor de Vénus,
Primavera, tua filha.

E quando ela são palomas
Da Maria, ou do enfeite,
As amoras são as pomas
E a Senhora dá o leite.

Tomar, Cidade Templária, 01/ 05/ 2006

IN HERBIS ET IN VERBIS

Paulo Jorge Brito e Abreu

sábado, 4 de maio de 2013

Que palavra, Senhor?


Pequeno rio à volta de Alportel
  
As palavras crescem como mapas-mundo inomináveis,
crescem como rios cheios de viscosos laços,
crescem como martírios, Senhor!
Palavras em busca de palavras, não sabem ver-Te,
mesmo aqui!
Vem, Senhor, trazei-me a delícia das Vossas palavras
que as minhas… não!
Senhor vem, depressa, em meu socorro!
Dizei-me: Onde estais,
em que simples palavra?
Giro à Vossa procura, e procuro uma só palavra Vossa
e morro porque não a escuto, ela não está aqui!
Tende piedade, Senhor!
Na poeira de tantas palavras, não há senão palavras
que não são Vossas, mas vãs...
E procuro mesmo assim a palavra, arrastando a alma já caída
como um tronco de árvore entontecido de  amor
e sem palavras de céu, de oração!                              
Pobre, como eu, sem ter nada, nem sequer uma palavra
para Vos oferecer, Senhor…

20 de Abril de 2013

                                                        Teresa Ferrer Passos

segunda-feira, 29 de abril de 2013

Estilhaços de amor


Francisco de Assis com o lobo

Estilhaços de amor cravados nas estrelas
salpicam-nos e trazem-nos lágrimas transparentes à
superfície dos olhos.
O caos cresce nos nossos corpos sem as sementes
do amor.
As horas extinguem-se nos corações vazios de amor.
Nascem desertos dentro dos nossos músculos,
dentro das nossas veias, dentro dos nossos ossos,
onde não sopra o vento manso do amor.
Tudo se esvai e desvanece quando nos esvaziámos
dos sinais vivos de amor.
Tudo se estilhaça de encontro às faces estranhas
de quem está connosco.
Soltam-se estilhaços do rosto dos desamparados sem um olhar de amor a alguém, a um simples alguém.
O vazio segue e o nosso caminho fica inseguro e árduo.
O vazio segue-nos, desfeito em nada,
sem procurar mesmo que sejam só uns estilhaços de amor. 

Nós olhámos para trás e pegámos-lhe na mão.
Restava-nos ainda um estilhaço de amor.

8 de Abril de 2013
                                                   Teresa Ferrer Passos

sábado, 27 de abril de 2013

Do consenso à paz social


«É essencial que, de uma vez por todas, se compreenda que a conflitualidade permanente e a ausência de consensos irão penalizar os próprios agentes políticos mas, acima de tudo, irão afetar gravemente o interesse nacional, agravando a situação dos que não têm emprego ou dos que foram lesados nos seus rendimentos, e comprometendo, por muitos e muitos anos, o futuro das novas gerações.»
(...)
«As instituições financeiras internacionais, fazendo uso da sua força persuasiva enquanto credores, terão induzido os governos dos países em dificuldades a aplicarem medidas que violam regras básicas de equidade, regras que constituem alicerces das sociedades democráticas contemporâneas. Ameaçando a coesão e a paz social, perturbaram a estabilidade das democracias constitucionais e geraram novos sentimentos antieuropeus.»
       Aníbal Cavaco Silva, Presidente da República de Portugal (Discurso na Cerimónia da Assembleia da República comemorativa do 25 de Abril de 1974)  

sexta-feira, 26 de abril de 2013

Gostar do que se faz

«Fazer o que se gosta ou gostar do que se faz? Pode parecer o mesmo, mas é bem diferente. Já Santo Agostinho dizia que o segredo de uma vida feliz estava em gostar - e aprender a gostar - de fazer aquilo que se tem que fazer e que é a nossa missão. Quem só faz aquilo de que gosta, limita-se a seguir os seus apetites e fica criança mimada. Nem é feliz, nem se pode contar com ele.»

        Vasco Pinto de Magalhães, in Não Há Soluções, Há Caminhos

quarta-feira, 24 de abril de 2013

Para lá do espaço das palavras














Quase impossível

O som das palavras caindo uma após outra
Na superfície do lago subterrâneo
Gotas opacas
Calcário de palácios pré-humanos
Pré-história das amibas

Sei o caminho
Ao menos isso sei

Atravessar a maldição dos ecos
A luz fantasmagórica
As sombras nas paredes

Ao menos isso sei

Descer à pré-história das estrelas
Reflexos perdidos entre grutas
Milenar chão sedimentado
Pó de calcário
Pegadas de astronautas do passado

Ao menos isso sei

Conter o ímpeto de rasgar o espaço
Descer ainda
Procurar o centro da manhã
No reino onde o sol nunca nasceu
Palácios do tempo das fadas e dos reis
Gotas de calcário nas vidraças
O lençol de água sob a terra

Ao menos isso sei

Mergulhar
Nadar até ao fundo
Até à sombra dos reflexos
Centro da névoa naufragada

Voltar à tona d’água

Isso sei – daí para a frente não sei nada

20/4/2013

Fernando Henrique de Passos

terça-feira, 16 de abril de 2013

Acerca do poema "O Meu Céu na Terra!..." de Santa Teresa do Menino Jesus



FACE DE JESUS, O CRISTO


ACERCA DO POEMA «O MEU CÉU NA TERRA!...»
de Teresa do Menino Jesus e da Santa Face. 


No poema «O Meu Céu na Terra!...», Santa Teresa do Menino Jesus descobre na Face de Jesus, o guia para as suas acções, o caminho para a sua santidade, o rumo para a missão de transmitir os Seus caminhos até aos confins do mundo.

A missão é, para Teresa do Menino Jesus, o objectivo maior da sua vida. Na procura de seguidores de Jesus, Teresa desvenda a Sua Verdade, provoca apóstolos da Sua divindade, lança arautos do Seu Reino de Amor.  

Logo, no primeiro verso de «O meu céu na terra!...» surge esplendorosa a imagem de Jesus. Ela impõe-se por si, ela conduz «os meus passos», escreve Teresa. Depois, a doçura do Seu rosto transforma-se num céu, já, aqui, na terra.

As lágrimas, que Jesus carrega no peso da cruz - no peso do pecado - tornam esse Rosto ainda mais sedutor, ao erguer-se como a «única Pátria» e um «Reino de amor».

Ao contemplar a Face salvífica de Jesus, Santa Teresa de Lisieux acha-se à porta do Mestre, a desencantar a semelhança, e assim, a tocar, quase a medo e sem medo, o «doce Salvador». 

Ao alcançar os «traços», ao receber as «marcas» da sua beleza próxima do humano e divina - uma beleza que não está apenas na imagem exterior, mas sobretudo na imagem interior -, Teresa de Lisieux esconde-se «sem cessar» nessa Face para que, no seu caminho pequenino, Jesus a deixe chegar à santidade. 

Ela sabe que, só desse modo, tem ao seu alcance a conquista de novos santos. Novos santos que Santa Teresa do Menino Jesus tanto ambicionava oferecer ao Salvador.   

16 de Abril de 2013

                                                                                          Teresa Ferrer Passos



O MEU CÉU NA TERRA

JESUS, A TUA INEFÁVEL IMAGEM
É O ASTRO QUE CONDUZ OS MEUS PASSOS
AH! TU BEM SABES, O TEU DOCE ROSTO
É PARA MIM O CÉU CÁ NA TERRA.

O MEU AMOR DESCOBRE OS ENCANTOS
DA TUA FACE EMBELEZADA PELO PRANTO.
EU SORRIO ATRAVÉS DAS LÁGRIMAS
QUANDO CONTEMPLO AS TUAS DORES
(...)

A TUA FACE É A MINHA ÚNICA PÁTRIA
ELA É O MEU REINO DE AMOR
(...)

O TEU ROSTO, Ó MEU DOCE SALVADOR
É O DIVINO RAMO DE MIRRA.
(...)

A TUA FACE É A MINHA ÚNICA RIQUEZA
EU NÃO PEÇO NADA MAIS
ESCONDENDO-ME NELA SEM CESSAR
PARECER-ME-EI CONTIGO, JESUS...
DEIXA EM MIM A DIVINA MARCA
DOS TEUS TRAÇOS CHEIOS DE DOÇURA
E EM BREVE, TORNAR-ME-EI SANTA
E ATRAIREI PARA TI OS CORAÇÕES.
(...)

                                     Teresa do Menino Jesus e da Santa Face

sábado, 13 de abril de 2013

O “PAI NOSSO QUE ESTAIS NO CÉU…” e SANTA TERESA DE ÁVILA




«E para Teresa o céu é a alma (...). “Neste pequenino palácio da minha alma cabe tão grande Rei (…) Que coisa maravilhosa! Aquele que poderia encher muito mais de mil mundos com a Sua grandeza vem encerrar-se numa coisa tão pequena”»

                                   Renato Pereira «O Pai-nosso de cada dia»
          in Revista de Espiritualidade, nº 81, Jan/Março 2013, p.25. 

terça-feira, 9 de abril de 2013

«Quando Orardes...»




«Santa Teresa de Jesus no seu caminho de perfeição fez um belo e suficientemente longo comentário a esta oração ensinada por Jesus; também ela constatava, à sua volta e em si própria, o quão longe estamos da verdade do que o Pai nosso encerra.»

               Alpoim Alves Portugal, «Quando Orardes...» in Revista de Espiritualidade,  nº 81, Janeiro/Março 2013

sexta-feira, 5 de abril de 2013

Um destino feito da forma das palavras
















De que palavras é feito o azul do mar?
Que sons conduzem ao fio do horizonte?
Que lendas dormem à espera de acordar
No dia em que a pena de um poeta as conte?

De que palavras é feito o cheiro a sal?
Qual é a cor dos sons que escorrem dos navios?
Que praia estenderá seu areal
Aos que um dia enfrentarão os céus sombrios?

Que alma habita a névoa leve, a rocha dura,
Com força de animal, ternura mais que humana?
– É a palavra passada e que é futura,
É o grito, é o langor, da língua lusitana…

27/11/2012

Fernando Henrique de Passos

quarta-feira, 3 de abril de 2013

A espada de fogo do arcanjo




A espada de fogo do arcanjo
Na cidade fria à noite
Quando arrepios de ar se roçam furtivamente nas vidraças
Do lado de fora das casas aquecidas

A espada de fogo do arcanjo
Quando os eléctricos passam esmagando a chuva fina
De luzes apagadas e luminosos estalidos de faíscas
Quando o peso da massa de ferro nos carris
É a única coisa que é real

A espada de fogo do arcanjo
Reflectida nas poças de água límpida
E nos cristais dos lustres exteriores

O rosto cristalino do arcanjo
Olhou-se na montra de uma loja
Olhou para lá do seu reflexo

A espada de fogo do arcanjo
Desceu devagar sobre a cidade
Procurou vestígios do dragão

Toca um telefone
Dentro e fora das casas aquecidas
Dentro e fora das alamedas frias
Dentro e fora dos cérebros das crianças
Que espreitam atrás dos vidros húmidos
Tão húmidos do lado de fora do conforto

Toca um telefone
Os sonhos electrónicos do século
Interrompem os sonhos de granito
Da cidade erigida sobre a terra
Interrompem secos e neutrais
Os sonhos lentos das raízes
Dos prédios presos à saudade
Do tempo definido dos dragões

A espada de fogo do arcanjo
Quando o brilho noctívago da urbe
Por pouco não rasgou o véu do tempo

A espada de fogo do arcanjo
Quando o brilho da chama se extinguiu
Por falta de um dragão

31/3/2013

Fernando Henrique de Passos