quarta-feira, 3 de abril de 2013

A espada de fogo do arcanjo




A espada de fogo do arcanjo
Na cidade fria à noite
Quando arrepios de ar se roçam furtivamente nas vidraças
Do lado de fora das casas aquecidas

A espada de fogo do arcanjo
Quando os eléctricos passam esmagando a chuva fina
De luzes apagadas e luminosos estalidos de faíscas
Quando o peso da massa de ferro nos carris
É a única coisa que é real

A espada de fogo do arcanjo
Reflectida nas poças de água límpida
E nos cristais dos lustres exteriores

O rosto cristalino do arcanjo
Olhou-se na montra de uma loja
Olhou para lá do seu reflexo

A espada de fogo do arcanjo
Desceu devagar sobre a cidade
Procurou vestígios do dragão

Toca um telefone
Dentro e fora das casas aquecidas
Dentro e fora das alamedas frias
Dentro e fora dos cérebros das crianças
Que espreitam atrás dos vidros húmidos
Tão húmidos do lado de fora do conforto

Toca um telefone
Os sonhos electrónicos do século
Interrompem os sonhos de granito
Da cidade erigida sobre a terra
Interrompem secos e neutrais
Os sonhos lentos das raízes
Dos prédios presos à saudade
Do tempo definido dos dragões

A espada de fogo do arcanjo
Quando o brilho noctívago da urbe
Por pouco não rasgou o véu do tempo

A espada de fogo do arcanjo
Quando o brilho da chama se extinguiu
Por falta de um dragão

31/3/2013

Fernando Henrique de Passos

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