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segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

Linhas de um dos seus romances...

Vergílio Ferreira (1916-1996)

«Debruçámo-nos da janela e o mar existiu logo na transcendência de nós, no sem-fim espraiado e todavia apaziguado da sua inquietação. Víamo-lo em baixo, aberto de toalhas rendadas de espuma para o invisível da graça que devia sorrir em nós. E havia o azul intenso da sua origem. E havia em nós o silêncio para tudo poder falar»

           Vergílio Ferreira, «Na tua Face», Bertrand, 1993, p.184

quarta-feira, 29 de outubro de 2014

Nascer de novo


No apagado segredo dos instantes,
frente ao mar, o amor elevou-se.
E foi um rochedo desde esse encontro.
Na espera e na vontade
nascemos de novo.
E o mundo não pôde ser mais o mesmo.

29 de Outubro de 2014 (21 anos depois)

                                           Teresa Ferrer Passos

quarta-feira, 25 de junho de 2014

Sentido



Abre os portões da tua casa
E não voltes a fechá-los nunca mais

Deixa a tua alma tornar-se igual à rua
E o teu respirar passar a ser o vento

Rasga essa membrana imaginária
Que te faz repetir desde que acordas
“Este sou eu, lá fora são os outros”

E quando a tua missão estiver cumprida,
Abre os braços, recebe a chuva branda,
Dissolve-te nas gotas indistintas,
Torna-te parte de algum rio,
Deixa-te arrastar até à foz
E mergulha enfim no vasto mar
Que és tu, que é Deus, que somos todos nós


24/6/2014

Fernando Henrique de Passos

sexta-feira, 5 de abril de 2013

Um destino feito da forma das palavras
















De que palavras é feito o azul do mar?
Que sons conduzem ao fio do horizonte?
Que lendas dormem à espera de acordar
No dia em que a pena de um poeta as conte?

De que palavras é feito o cheiro a sal?
Qual é a cor dos sons que escorrem dos navios?
Que praia estenderá seu areal
Aos que um dia enfrentarão os céus sombrios?

Que alma habita a névoa leve, a rocha dura,
Com força de animal, ternura mais que humana?
– É a palavra passada e que é futura,
É o grito, é o langor, da língua lusitana…

27/11/2012

Fernando Henrique de Passos

terça-feira, 27 de novembro de 2012

Na minha língua, viajo no mar


"Uma tempestade", pintura de Antonio Francesco Peruzzini


NA MINHA LÍNGUA, VIAJO NO MAR**


Perdido e sem sentido.
Mas nosso, o mar.
À sua beira, nos areais, Tejo adentro,
crepita nos ares um cheiro a perda,
a desconcerto, a rompimento.
O povo pobre, disperso ou em uníssono,
grita dentro de si um arraial cheio de mares
descobertos e em ruínas.
Ninguém troca palavras de esperança,
um desespero que toca as raias do inferno
avança.
E os pobres não podem ser dispensados
de contribuir para pagar a dívida do estado,
que não teve norte e foi injusto na governação.
Metam-se na barca e rompam novos mares,
disse o primeiro-Ministro. Os cofres estão vazios.
Os pobres, ao ouvirem isto, responderam:
O mar é a nossa língua cheia de naufrágios,
de caravelas e de Adamastores medonhos.
Não teremos medo, largaremos pelo salgado,
deixaremos este estado corrompido,
com tanta insensatez e loucura.
Depois, ainda o primeiro-ministro repetiu: Não, não temam
as saudades da natal terra. Rumem ao mar.
Aí está a salvação. Depois do temporal, regressem.
Portugal vai renascer.
Os pobres responderam: Iremos!
Levaremos o mar imenso da nossa língua.
E no mar da nossa língua em que viveremos
não se perderá do nome de Portugal,
mesmo sendo nós pobres,
sacrificados de impostos
por governos que nos defraudaram.
No mar, enfim, teremos paz.
O mar é do povo que o atravessou
no Século grande de Quatrocentos.
O mar que nos levou a outros mundos.
Esse mesmo mar será ainda nosso,
como o foi de Vieira, de Pombal ou de Pessoa.
O mar nos abraçará com as suas infinitas ondas
e nos abrirá as portas do mundo,
que nós escrevemos em língua lusa.
Nessa língua lusa a escrever-se,
a exaltar-se e a dobrar os novos
e não menos difíceis Cabos das Tormentas.
Ainda e sempre voltaremos, disse o povo.


27 de Novembro de 2012/18 de Março de 2015

                              Teresa Ferrer Passos

** Foi publicada a 1ª versão deste texto no Blogue Harmonia do Mundo em 27/11/2012). Esta 2ª versão substituiu-a e é datada de 18/3/2015.

quarta-feira, 21 de novembro de 2012

Apartamento em Lisboa


Uma praia veio aqui desaguar:

As areias, as águas, os rochedos,
O cheiro espumarento que sopra sobre o mar,
Naufrágios, piratas, monstros e sereias:

Todos os medos:

Rochedos e águas e areias,
A incerta e esponjosa substância
Que é o nevoeiro correndo pelas veias;
Aos nossos pés
Um torvelinho entrelaçado com a ânsia,
A lista das ondas e marés,
O sal colado à boca e às narinas,
O fundo escuro e acre das cavernas,
As medusas demasiado femininas,
Rasgões nos braços e nas pernas,
Sol aos golfões,
Arrastando cofres e jóias e dobrões
E os destroços antigos de velhas caravelas:

Tudo me entrou pelas janelas
Quando pegava na caneta
E procurava o frasco da tinta violeta
E o papel se entornou sobre o soalho
E das gavetas da mesa de trabalho
Saíram caranguejos
Enrolados em medusas e desejos
E as cores absurdas do sol unido ao mar
Misturavam o gelo do azul com a febre do vermelho a delirar…

Parei e respirei o cheiro a iodo:

E nessa altura possuí o mundo todo.

13/5/2012

Fernando Henrique de Passos

quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Dalila

à memória de Dalila Pereira da Costa

Os pés nus de sal no mar que se dissolvem
Cabelos soltos longos de bruma vento e sonho
Dedos que tocam com força e com carinho
Fragmentos de papel à tona d’água
As folhas dos livros as lombadas
A biblioteca que se mistura com as algas

A vestal de búzios entre as mãos
Aguarda a distância o chamamento o horizonte
O aproximar das linhas infinitas
O poeta que um dia surgirá por entre as ondas
E trará já não mensagens mas respostas
Respostas que virão de outros passados

Fitando um só futuro
Ela mergulha (é quase a Hora)
E faz já parte dessas lendas
Que húmidas darão à costa um dia
E nos despertarão

1/6/2012

Fernando Henrique de Passos

in Nova Águia, Nº 10 - 2º Semestre 2012, p. 64

segunda-feira, 5 de novembro de 2012

A luz daquele dia
















Na velha rua da velhíssima cidade
Passa um velho casal de namorados,
Os rostos orvalhados
Pela manhã de Inverno.
Sobe no céu o sol que o Padre Eterno
Mandou que brilhasse intensamente.
Vinda do mar,
A névoa fresca sente
Que o dia a vai amar.
O cheiro a maresia
Acorda e inebria
Um bando de pardais.
A catedral deixa brilhar os seus vitrais
E abre as portas ao par de namorados.
Ei-los agora ajoelhados.
“Lembras-te daquele dia de Novembro?”,
Diz ele. Diz ela: “Lembro…”
Deram as mãos. Olham o altar.
Ouvem o som do mar a marulhar,
A lembrar-lhes o mar daquele dia.
E o cheiro a maresia
Invade a catedral,
Beija ao de leve um castiçal,
Acende uma chama numa vela.
Além dele e dela,
Mais ninguém a vê.
Olham-se e sorriem só eles sabem de quê…

5 de Novembro de 2012

Fernando Henrique de Passos

Maresia




No altar do amor ergueu-se o som do mar.

Com chamas de maresia, uma vela pequenina

brilhou, como um natal, suave e denso.

Depois, o nosso olhar tocou o céu,

descido por instantes.

As nossas almas beijaram-se  

como um sal.

E o perfume do mar ficou ali

só para louvar a Deus

que o nosso amor abençoava.

5 de Novembro de 2012

Teresa Ferrer Passos