terça-feira, 9 de outubro de 2012

Do Lado de Fora da Noite



Desce à cidade.
Desce à baixa da cidade,
À parte velha:
Lá tudo são sinais.
Deves ir de noite.
Repara no brilho que há à porta do saloon,
Mas não entres.
(Não podes ainda permitir que a realidade
Se substitua às suas representações.)
Caminha ao acaso em todos os sentidos,
Por todas as ruas,
Mas procura ruas sempre mais estreitas,
E quando encontrares uma rua tão estreita que te esmague,
Nela haverá uma só porta:
Abre-a: estarás em tua casa.
Liga o televisor antiquado.
O preto-e-branco ofusca-te.
Mergulhas nas várias tonalidades de cinzento
E deixas-te ir ao fundo.
Voltas à superfície num jardim diurno
Na parte mais nova da cidade.
Mas não desistes,
Esperas a noite,
Voltas a descer até à baixa,
Até à parte velha da cidade.
E voltarás a encontrar a tua casa,
E inumeráveis vezes a perderás de novo,
Pois será essa a tua forma de existir.
Mas chegará a noite em que tinhas aberto a porta do saloon
E tinhas visto para lá das representações
E tinhas entrado
E tinhas decidido ficar
Quando o aparelho te acordou
E percebes que estiveste acordado todo o tempo.
Mergulhaste então nas várias tonalidades coloridas
E deixaste-te purificar por elas.
Deita-te agora e abre os olhos,
Descobre o que a realidade te guardou:
Estar à entrada seria a tua casa:
Podes entrar.

6/10/2012

Fernando Henrique de Passos

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