segunda-feira, 17 de outubro de 2022

POR OCASIÃO DO MEMORÁVEL 200.º ANIVERSÁRIO DA INDEPENDÊNCIA DO BRASIL, EM 7 DE SETEMBRO DE 1822

Excerto de um artigo que publiquei no «Diário de Notícias», em 26/6/1988, sob o ortónimo de Teresa Bernardino:


"Em 1822 rebentou uma revolta contra o domínio português, que D. Pedro conseguiu dominar, e, no mês de Abril, o jornal Revérbero propôs ao Regente que fosse “o fundador do novo Império”. Pouco depois, a Maçonaria com o apoio do Senado e do Conselho de Procuradores-Gerais das Províncias ofereceu a D. Pedro o título de Protector e Defensor Perpétuo do Brasil, que ele aceitou a 13 de Maio, dia do seu aniversário.

A agitação nas províncias era incrementada pelo confronto entre os partidários da autonomia (personificada por D. Pedro) e aqueles que desejavam obedecer às determinações das Cortes Constituintes da metrópole. O Brasil estava dividido entre as duas facções, sendo a mais popular contrária à Assembleia Legislativa de Lisboa, que só humilhava a tão venerada emancipação. Eram recebidas como ordens afrontosas a continuação de D. Pedro como “Regente até à publicação da Constituição, mas sujeito ao rei e às Cortes” e a instauração de um processo ao governador de S. Paulo por ter pedido a permanência do príncipe no Brasil.

As instruções das Cortes de Lisboa foram interpretadas como uma interferência abusiva no poder do regente por vários conselheiros, que o consideraram mesmo “prisioneiro das Cortes”, instituição que mostrava tentar “escravizar o Brasil”.

Era o dia 7 de Setembro de 1822 e D. Pedro encontrava-se nas proximidades do pequeno rio Ipiranga quando alguns emissários lhe deram conhecimento destas últimas decisões oriundas de Lisboa. Resolvido a não continuar sob a tutela da revolucionária Assembleia liberal portuguesa, D. Pedro proclamou a ansiada “Independência ou morte”, que o iria ascender a primeiro Imperador do Brasil. Aclamado e Coroado Imperador na Capela Imperial do Rio de Janeiro, no dia 12 de Outubro de 1822 (o príncipe dera o mais lato sentido à decisão tomada a 9 de Janeiro de 1821, pela qual desobedecia às Cortes, ao ficar em terras do Brasil).

Em carta justificativa desse ato, afirmava que se saísse do Brasil, logo este se tornaria independente, enquanto se ele aí permanecesse, o território não se separaria de Portugal. A sua convicção maior era a de que a força das armas não podia impedir a independência, mas sim “o comércio e o brio da reciprocidade”, porque ambos “são as duas molas reais sobre que deve trabalhar a monarquia luso-brasílica”.

A ideia de conservar a ligação entre as duas Cortes é incontestável em numerosas cartas dirigidas pelo Imperador D. Pedro I a D. João VI, mas as fortes pressões internas por parte de instâncias políticas e sociais, a prepotência das Cortes constitucionais, que procuravam retirar ao território a autonomia alcançada ao longo da permanência de D. João VI na colônia, as honras e os títulos que os brasileiros lhe outorgaram, com o cognome de Defensor Perpétuo do Brasil, foram os principais fatores da mudança. Esta está patente nas cartas posteriores ao mês de Maio de 1821. Era, de fato, inegável o seu exultante entusiasmo ao escrever que tratava os brasileiros não só como fi lhos “como V. M. me recomendou, mas também como amigos”.

Noutra passagem nota a necessidade de não inverter a evolução que os tempos e as conjunturas provocaram: “Sem igualdade de direito em tudo e por tudo, não há união”. Nessa disposição de espírito, propunha-se defender os direitos dos brasileiros, se necessário com o seu sangue “que não corre senão pela honra, pela Nação e por V. M.”. Para fundamentar a insubmissão perante as Cortes, escreverá ainda sobre a sua adesão à causa da “colônia”: “Não sou rebelde, como hão de dizer a Vossa Majestade os inimigos V. M., são as circunstâncias”.

O grito do Ipiranga culminara um longo processo não iniciado em 1820, como muitos afirmam, mas remontando à chegada de D. João VI e toda a Corte portuguesa ao Atlântico Sul. A revolução de Agosto de 1820, se trouxe a vantagem de fazer regressar o rei à Metrópole, teve na sua essência e como objetivo maior, recuperar os mercados brasileiros, tão preciosos à burguesia portuguesa (importação-exportação). Este móbil tornou as Cortes constituintes gravosamente hostis à comunidade brasileira, que já não podia aceitar a perda da larga autonomia política ou a fuga dos valores econômicos que estavam a fazer prosperar aquele extenso e rico domínio português.

A exigência do regresso do príncipe-regente, escolhido pelo rei de Portugal, numa difícil conjuntura interna do Brasil, em parte aderente às revoluções autonomistas e republicanas da América do Sul, foi o detonador de uma situação insustentável, quer para Portugal, quer para o Brasil.

Sem poder lutar contra as circunstâncias, como escrevia o Imperador D. Pedro I a seu pai, conseguiu, no entanto, não provocar o ódio ou até levantamentos de armas contra a Pátria lusa, que no ano de 1500 começou a desbravar e a engrandecer a futura grande nação da América Latina. Longos anos de permanência naquela terra promissora, deram a D. Pedro I a noção exata do seu glorioso porvir que ele quis ajudar a edificar.»


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