|
Uma pintura de Júlio Pomar (Fernando Pessoa, 1985) |
( invoco, para a Musa minha, o Ás de Paus )
I
Eu leio, até ao lai, tua Poesia
Que legaste a nós outros, e ao Graal,
Modernista do Verbo e da estesia,
Maravilha da «Ode Triunfal».
Guardador de rebanhos e palavras
Que foram qual abraço e qual o Hermes,
Da Rosa, verde lenho e verdes águas,
De ingénitas, irónicas e lemes,
Tu lias, ao crepúsculo, o experto
Cesário sentimento nosso Mestre,
E eu leio, ao lusco-fusco, o «A» de Alberto,
Que é símil ao Pastor e ao silvestre.
Se a sêmea foi «Orpheu» numa Lisboa,
O sémen é Infante que apaixona;
Se lúdica é a barca, ó tu, Pessoa,
Ajuda-me a trovar uma «Persona».
II
Marítimo é o viático ou viagem
Nas Índias duma nave mais etérea,
Que a Musa tem a gema, e, na «Mensagem»,
A mente vai agir sobre a matéria.
Em Gólgota glosavas a semente,
Em Crânio cavalgavas esse potro;
A mântica era a meta, e tua mente,
O discurso d’amável e do Outro.
Que eu sinto, meu Amigo, o teu exemplo,
Coas tábulas falando o magistério:
Se a forma de Ulisseia é tal e templo,
Descubro, na Palavra, o Quinto Império.
III
E, se a gema do Mestre é sal e pão,
Se «Opiário», foi alucinogénio,
Não façam, só da «pólis», a prisão,
Não matem, outra vez, o verde Génio.
Lisboa, Janeiro de 2004
MENS AGITAT MOLEM
Paulo Jorge Brito e Abreu