sexta-feira, 23 de maio de 2025

 ESTRANHO POEMA


ao longe vejo as marés escavarem
com as suas mãos ondulantes
túneis desabitados. Ali a memória lia-se
num dia perdido de si e
em que o azul do céu se espelhava
no mar mais sereno
que alguma vez penetrara o meu olhar. 
eram tempos místicos
em que ninguém me olhava porque as marés
me escondiam nas dobras dos seus
corpos volúveis.
era o tempo em que as minhas mãos se enlaçavam
para se protegerem dos olhares indiscretos.
era o tempo de aprender a abraçar
a brandura dos sinos da igreja abandonada.
era o tempo em que os músicos não tocavam
ainda os acordes do magnífico órgão
a sugar as mãos
encapeladas de sons imensos, esses sons
que exaltavam o novo destino a vibrar alto
toda a preciosa beleza de um Deus de mãos
sôfregas de novas liturgias a apagar
o silêncio do nada.
nesse tempo eu escutava os murmúrios
piedosos da música
e escrevia nas minhas mãos poemas com
a brancura da espuma.
depois embrulhava-os no meu pequeno
quintal bordado de canteiros de jasmins
a florir e ainda a prometer-me
escrita de um  estranho poema.

22 de Maio de 2025

                           Teresa Ferrer Passos

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