terça-feira, 24 de setembro de 2024

interminável ritual?


 vejo ao longe gigantes em chamas

ou páginas de livros por escrever?

não! são apenas árvores doridas de cansaço e vertigem.

mulheres com baldes de água tirada de um poço correm,

e ouço a sua voz quase inaudível a dizer

que estão isoladas do mundo, lá, num além sem vivos.

ninguém, ninguém! pronunciam a custo

entre as nuvens de fagulhas da cinza,

entre borregos e ovelhas a tresmalharem-se, sem guia, 

que fogem das fogueiras rasteiras à terra 

e rentes ao céu, oh que altura! 

vejo o avanço das chamas com a rapidez

misteriosa de um vento agreste

que parece procurar ainda folhas frescas

e carne fresca que não come, mas devora

com sofreguidão.

Vejo ao longe um desespero pálido

a invadir as almas aprisionadas

no ar sufocante daquela visão infernal a entoar

gritos de medo e sem uma lágrima.

as lágrimas secaram depressa demais! o calor intenso sufoca!

vejo os corpos prostrados de luta e mágoa; 

já perderam a força capaz de vencer a morte

 e enrolam-se com as mãos a parecerem

folhas abafadas pelo fogo e pelo fumo. 

vejo as casas das aldeias perdendo os telhados

e as fotografias guardadas para sempre,

tornam-se um papel negro em que não está ninguém. 

Vejo que os troncos revestidos de negro,

continuam firmes na sua grandiosidade.

esperam ainda a frescura outonal?

e uma brisa suave ainda chegará a tempo

de os ressuscitar e devolver à vida?

24/9/2024

Teresa Ferrer Passos

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