terça-feira, 4 de dezembro de 2018

TRIBUNA DA MADEIRA - Fátima Pitta Dionísio:O Arquétipo e Arca, o Arcano do Sol

"O Carro de Apolo" de Frederick Arthur Bridgman
(1847-1928)

                                                 «Ser génio quer dizer reproduzir-se igual a si próprio.»
                                                                                           José de Almada-Negreiros

Na terra que viu nascer, além de Cristiano Ronaldo e Octávio de Marialva, José Tolentino Mendonça, Edmundo de Bettencourt e o Poeta Herberto Helder, ex-siste ou insiste, para o bem da letradura, uma Poetisa com o nome de Fátima Pitta Dionísio: sobre ela trataremos e dessarte batalharemos. Ora aqui a nossa tese nos indica, sobremaneira, que essa Pitta é qual a Pítia, que ela viaja, viridente, no Carro de Apolo.
A ciência Pitagórica, ela firma, portanto, e confirma: a Fátima pertence ao número das pessoas que laboram, liberais, para toda a Humanidade – e ela sidera ou considera, ela vive em templação, contemplação, da platónica Ideia. Considerar quer dizer: teorizar, especular, esquadrinhar o sidéreo com a ajuda de um espelho. Se alia o Vero, com todas as veras, à Bondade e à Beleza, e todo o canto, segundo Kant, é lautamente desinteressado. Sendo essa Ideia, aqui, o sinónimo de Arquétipo, o inconsciente pessoal abarca, ele abraça, o inconsciente colectivo. E daí a presença, na Poesia Fatimita, dos arcanos siderais, e dos símbolos e Mitos – e não alembras, ó ledor, e não remembras o seu livro, do ano 2011, «No Amor das Coisas Gregas»??? Mas o «Homo», terreno, vem do humo, e é por isso «Homo Viator». Dando filhos e poemas ao mundo e não ao mando, a Maternidade e a Poesia, elas são, para a Poetisa, duas formas de sortilégio, ou melhor, duas formas de sacerdócio.
Pertence a voz e a vez à «Vocação Solar», ao Arquétipo e barca da Portugalidade. Na prosa e na Poesia de Fátima Pitta Dionísio, é tudo uma questão de metáforas, metonímias, de lautas litotes. Porquanto é explícito, é lícito dizer: «Três vezes conheci / O fecundo húmus da terra / Pela frutescência do corpo / Num silêncio sacramental.» E sublinhemos o vocábulo: «sacramental». Que o dar à luz é sagrado e sacrifício, quero eu dizer, é sacro fazer. E mergulha, a matriz, na «Mater Matuta» e nas águas da vida – e por isso a Matronália, e por isso a Maria é qual Estrela do Mar; e Maria «gratia plena», e «Ave Maris Stella» digamos nós ora. Pois só avoca, ou invoca, quem dá a voz ao vocábulo, quem é qual advogada, e convocada para a Poesia – e falamos aqui da Musa, e falamos da Autora da «Vocação Solar».
E sendo, desta sorte, a feitora ou fazedora, a Autora é promotora, ela é, por isso mesmo, a força motriz. Pois movendo, emocionando e comovendo, a Fátima frutesce, ela é actriz, fundamental, no palco do Universo. A generosa, nas gentes, sendo a genuína. O génio, genital, aquele que gera – e apelamos, aqui, à sinérgica energia. Ao lume, à luminária, da ilha da Madeira – e eis aqui matéria-prima, o litoral, alfim, da
literariedade. Que neste livro capital, nos surde e surge, Fátima Pitta Dionísio, a modular, a moldar, a modelar sua Palavra – e o modelo, pra ela, é a «Alquimia do Verbo» de que fala Rimbaud. Então o nome, para Fátima, é qual acume, ele é, luminar, o lume e o Nume. Ouçamos o que ela asserta, em lauda liminar: «Nomeio-te / príncipe da minha alma / pelo dom / de um silêncio volátil / e andorinhas acesas / em corpos desnudados / pelos sopros férteis do ar». Ou melhor: o Espírito é «Ruah», o Espírito é o Sopro e o Sopro é o Pneuma – e eis a voz, a vocação, do Espírito Paracleto.
E o astro é o estro, e o Toth é o Tau. E a Cruz vigora e aprimora, e o crisol é o símbolo da purificação. Na Obra de Fátima, mais do que ser, o Homem, animal racional, ele é, acima de tudo, um simbólico indivíduo. Que o viático é vianda, e o Pão, dessarte, é para ser partilhado. Citemos Manuel Bernardes: partilhado e portanto «partido em pequeninos». Que em arcaica reminiscência, ou representação colectiva, o símbolo une, a Poetisa, à Igreja de egregório – e o Espírito assopra, e ela se volve numa egéria do carme. Se o símbolo está próximo duma alegoria, se o símbolo é um mito, propalamos, alegremente, a Alegoria da Caverna. Da cafurna, da cafua ou do Antro de Trofónio???
As Musas, afinal, são filhas de Mnemósine, o Vate é Vaticano. E é Museu ligado a Orfeu e qual o templo das Musas. Saberá então, a Autora, caroal, do «Amor em Memória», que a Poesia é Pão da Vida, que é Poeta, afinal, o Cristo Jesus, e que, segundo Emerson, o estadunidense, nada de grande foi feito, neste mundo, sem o entusiasmo. Se o entusiasmo é próprio do espírito pitónico, se a Pítia vela Apolo, «entusiasta» vem do Grego e quer dizer: «aquele que porta, consigo, um deus interior.»
Ou melhor: privou a Fátima, em moça, com Octávio de Marialva, ela foi, muito cedo, iniciada nos Mistérios. Na mística ou Mistérios, na «Mystery Play». E seu pendor universalista, e portanto sem partidos, ela o bebeu, em a benesse, no boníssimo Padre Alfredo – e já falámos, figadal, do Padre Alfredo Vieira de Freitas. Ou melhor: da Poesia como oblata e duma oblata como Obra. Concernente e atinente às manhãs do seu silêncio, as Musas «Amam a luz primeira, / Ancestral mito / Que os poetas anunciam / Desde antanho. / A prumo sobre o mar / A prata da noite as envolve / Com os anéis de secreta carne. / O sol é, hoje, / Uma metáfora de luz no dia» - e não lobrigas, arcangelical, o arquivo, o arcaico, o arcano do Sol??? 
Eis no Sol, enfim, o típico e tópico desta Poesia, eis no Sol, afinal, os tópicos e tropos da Sabedoria. À luz, então, do que nós já firmámos, em Atenas demandaram, um poucochinho antes do divino Platão, ao filósofo Anaxágoras: «Para que estás tu nesta terra???» Sua resposta, preste e pronta: «Para a consideração contemplativa, ou teoria, do Céu e da ordem do Universo.» E nesse universal, aqui se acoita, e acolhe, a Poesia de Fátima. Quando se busca a Verdade, e nada mais que a Verdade, quando se quer, ou se inquire, o Ser enquanto Ser, nós somos segundo a escola, nós somos apologetas da nossa Teoria – e coteje, com «Êxodo» 3: 14, o exímio do exílio, o «ek-stático ex-sistere». Tinha razão, recta e escorreita, o Álvaro Ribeiro: Literatura é teofania, Literatura é qual expressão do preternatural – e daí o seu liame com o transe e com o êxtase, com o «rêve éveillé», ou o sonhar acordado. Se aqui temos a escritura como forma de oração, aventamos, na verve, a proposição: Fátima Pitta Dionísio, na ilha da Madeira, ela não usa, a Poesia, para os seus fins particulares, mas ela a goza graciana, ela glosa, a Poesia, no estado de graça – e daí nossa «Poesis», e daí o desinteresse da tese enquanto estese.
Sobre ela o Céu estrelado, sobre a sua cabeça – a lei moral, Kantiana, no seu coração. E segundo Wilhelm Dilthey, e segundo o Carl Rogers, uma enfática, empática, compreensão, a preensão que permite pôr o penso e pensar. Muito longe de nós o pensar materialeiro, muito longe de nós a prisão positivista. Nós não explicamos, cientista, a Poesia de Fátima, nós fazemos como a criança – e apertamos, essa Poesia, de encontro ao peito nosso. Em nós, por isso mesmo, a simpatia, ela cura e ela sara a patologia. E nossa práxis, portanto, em Psicoterapia: a aceitação positiva e incondicional. Aquela que é feraz, aquela que se tem perante o Génio, generoso, e o Ser enquanto Ser.

A insistência dos Génios e a excelência das Mães: eis as duas maiores provas da existência de Deus. E que mais, Amigo leitor??? De mais falámos nós, e estamos quase a findar. Fraternos são, como a Fátima, os que fazem a Paz. Felizes são, por isso mesmo, os precitos e malditos: é que eles serão abençoados, e consolados no Sol. Na Paz de Cristo. E Paz, por isso, em vida avonde. E Paz, na nossa terra, para os filhos da Luz.

Queluz, 12/ 09/ 2018 – 29/ 11/ 2018

AD MAJOREM DEI GLORIAM
Paulo Jorge Brito e Abreu

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