terça-feira, 20 de julho de 2021

POEMA INÉDITO:



A PALAVRA ESTÁ NO DESERTO


                                       Ao Fernando                      

Nos valados entremeados de sombras,
os penhascos avançam desenfreados.
Animais fantásticos escondem-se,
depois entram no palco vasto e revelam-se.
Com risos mordazes ferem o som do silêncio
e gritam. Há algazarras de loucos que quebram
a paz dos lugares. Cães ladram como selvagens.

E nós, tu e eu, seguimos num cavalo alado
que nos conduz ao deserto.
A vida resiste aí. E aí ficamos
com todas as palavras nunca ditas.

20/7/2021
                                                  Teresa Ferrer Passos

UM POEMA INÉDITO

Casamento de Teresa e Fernando na Igreja
de S. Nicolau em Lisboa, em 19/2/1994

METAMORFOSE

    No 28º aniversário do dia em que nos conhecemos

Narciso escancara uma janela
Sobre um mar de espelhos em estilhaços
Espelhando a ruína de uma noite
E a súbita vertigem dos espaços.

O fim de um mundo fechado sobre si
Enfim aberto à luz dos outros mundos.
A estéril escuridão a dar a vez
À claridade dos dias mais fecundos.

Mudou Narciso, já tem um novo nome,
Mas quem muda de nome não é um qualquer.
Mudou Narciso ‒ e mais irá mudar ‒
Por obra e graça de uma mulher sem par.

20/7/2021

                      Fernando Henrique de Passos


Comentário no Facebook:

Uma memória linda, Fernando, a reerguer-se das noites e dos dias, das desventuras e das venturas, dos tropeços e das levezas, em anos a vibrarem o Amor, à maneira do belíssimo "Cântico dos Cânticos" que Deus nos ensinou.

                                                                             Teresa Ferrer Passos

domingo, 18 de julho de 2021

UM ARTIGO SEM A ARIDEZ DA NORMALIDADE...




Lembrando Auschwitz, S. João da Cruz e Etty Hillesum, escreveu o Padre João Manuel Teixeira da Costa (Ordem dos Carmelitas Descalços):

«Deus pode também penetrar e adentrar-se por sob a carapaça de chumbo do horror sem nome fabricado pelos homens. (...) "Torna-se cada vez mais claro o seguinte: que tu (Deus) não nos podes ajudar, que nós é que temos de te ajudar, e, ajudando-te, ajudamo-nos a nós próprios" (Etty Hillesum). E evitando-se assim, as garras da águia iníqua, mas sofrendo-as, se chega à união, porque "ninguém fica nas garras de ninguém, se estiver nos teus [Deus] braços" (E.H.).
Sim, o século vinte e um pode oferecer orações e flores a Deus, porque o que porventura Deus não possa fazer haveremos nós de O ajudar a poder fazer. (...) Quando Juan de la Cruz descreve o processo empoderador da 'noche oscura' tem, sem dúvida, diante de seus olhos, o aniquilamento de Jesus, em Quem não houve maior perder para melhor ganhar! (...) Ainda é possível semear flores no coração!»

João Manuel Teixeira da Costa, "Se eu de ti me esquecer! Poderemos ainda oferecer flores no século vinte um?" in «Revista de Espiritualidade», nº 111, Julho-Setembro/2020, pág. 91, 92 e 93.

domingo, 11 de julho de 2021

POEMA INÉDITO

Minha mãe, Natércia Paz Ferrer,
ao centro, com colegas do Hospital (1948)

 CAMINHO

                    A minha mãe

 um caminho abriu-se nas enigmáticas águas

o rochedo soltou-se

das tuas mãos de pó

ávidas de compaixão.

ali ninguém passava

só um delírio de amor cresceu

no teu coração de fogo.

      11 de Julho de 2021 (31 anos depois da despedida)

                     Teresa Ferrer Passos